"No que você está pensando?" : o discurso do mal-estar Docente produzido no Facebook e a fabricação dos modos de ser professor na contemporaneidade

Caetano, Letícia Farias

Abstract:

 
Esta Dissertação tem por objetivo investigar o discurso do mal-estar docente produzido no Facebook e como este vem incidindo nos modos de ser e exercer a docência na contemporaneidade. Para isso, apoio-me nos estudos pós-estruturalistas e em alguns conceitos-ferramentas de Michel Foucault, tais como governamento e processos de subjetivação. Analiso nessa pesquisa algumas postagens publicadas nas páginas "Professores Sofredores", "Professora Indelicada" e "Pedagogia da Depressão", durante o período de 2012 até junho de 2016, assim como os comentários dos professores feitos nessas páginas. A escolha por essas páginas deu-se devido ao maior número de seguidores. Ao selecionar meu material empírico, produzo cinco categorias analíticas, quais sejam: 1) Professor, o salvador da nação: práticas pastorais reconfiguradas ao exercício docente contemporâneo; 2) Mal-estar docente; 3) Medicalização docente: a proliferação de doenças físicas e psíquicas como produtores da Biodocência; 4) "Desculpe o desabafo": a sociedade da hiperconfissão como constituinte das "extimidades docentes" e 5) Entre a ironia e a contestação: possíveis movimentos de resistência e contraconduta. Ao analisar o primeiro eixo percebi que alguns discursos sobre a docência vinculam-se as práticas do poder pastoral, estudado por Michel Foucault. Nesses discursos encontramos expressões como missão, vocação, amor, renúncia, sacrifício, etc., que aparecem associados ao exercício docente. Na segunda unidade analítica apresento algumas contribuições deixadas por Esteve (1999) ao discutir sobre o mal-estar docente. Nesse estudo, o autor traça alguns motivos que vêm agravando o processo de mal-estar sentido pelos professores: problemas de relacionamento entre colegas de profissão, pais e alunos, desvalorização salarial, excesso de atribuições destinadas à função docente, etc., são alguns dos indícios analisados. Ao olhar para os discursos dos professores no Facebook percebi algumas recorrências, aproximando-se das discussões de Esteve. Já na terceira unidade venho discutindo sobre o processo de medicalização docente. Nesta, visualizo que algumas causas sociais são transformadas em patologias, em descrições médicas que precisam ser diagnosticadas e tratadas com o uso de medicamentos. Muitos professores afirmam não conseguir exercer a docência sem o uso de remédios, indicando uma preocupante constatação. Essa recorrência discursiva aproxima-se das discussões de Caliman (2013), pois a autora afirma que estamos vivendo em uma era das cidadanias biológicas em que os corpos dos sujeitos são marcados por doenças. Assim, produzo o conceito que venho sustentando nessa pesquisa de Biodocência, pois entendo que algumas doenças físicas e também psíquicas vêm marcando e constituindo as formas de ser professor na contemporaneidade. Na quarto eixo dessa investigação analiso alguns desabafos dos professores feitos nas páginas virtuais. São queixas e lamúrias de seu exercício docente que são confessadas publicamente, esmaecendo as fronteiras entre o público e o privado, aproximando-se das discussões de Sibilia (2008) sobre o conceito de extimidade. E na última seção mostro como algumas postagens e narrativas dos professores estão associadas a um movimento de contraconduta, discutido por Foucault. São discursos fortemente marcados por um tom de ironia, ou que se manifestam de forma contrária ao que está posto em certos memes, criados pelas páginas. Assim, em cada categoria analisada, fui percebendo que o discurso do mal-estar docente produzido no Facebook vincula-se a outros tantos discursos, como o da missão, o da medicalização, o da hiperconfissão e o da contestação, e que todos esses discursos vêm operando estratégias de governamento e agindo nos processos de subjetivação docente.
 
This dissertation aims to investigate the teacher malaise discourse produced on Facebook and how it has been influencing the ways of being and practicing teaching in the contemporary world. To that end, I rely on post-structuralist studies and on some of Michel Foucault's concepts-tools, such as governance and subjectivation processes. I analyze in this research some posts published in the pages "Professores Sofredores", "Professora Indelicada" e "Pedagogia da Depressão, during the period of 2012 until June 2016, as well as the comments of the teachers made on these pages. The choice for these pages was due to the greater number of followers. Selecting my empirical material, I produced five analytical categories, which are: 1) Teacher, the savior of the nation: pastoral practices reconfigured to the contemporary teaching exercise; 2) Teacher malaise; 3) Teaching medicalization: the proliferation of physical and psychic diseases as producers of Biodocence; 4) "Sorry for the outburst": the hyperconfission society as a constituent of the "teacher extimacy"; 5) Between irony and contestation: possible movements of resistance and counterconduct. In analyzing the first axis I noticed that some discourses about teaching are linked to the practices of pastoral power, studied by Michel Foucault. In these discourses we find expressions such as mission, vocation, love, renunciation, sacrifice, etc, which are associated with the teaching exercise. In the second analytical unit I present some contributions left by Esteve (1999) in discussing teacher malaise. In this study, the author outlines some reasons that have aggravated the process of malaise felt by teachers: problems of relationships among colleagues, parents and students, wage devaluation, excess of assignments destined to the teaching function, etc, are some of the indications analyzed. Looking at the teachers' discourses on Facebook I noticed some recurrences, approaching Esteve's discussions. Already in the third unit I have been discussing about the medicalization process of the teacher. In this, I visualize that some social causes are transformed into pathologies, in medical descriptions that need to be diagnosed and treated with the use of medicines. Many teachers say they cannot do teaching without the use of medication, indicating a worrying finding. This discursive recurrence is close to the discussions of Caliman (2013), since the author states that we are living in an era of biological citizenships in which the bodies of the subjects are marked by diseases. Thus, I produce the concept of Biodocence that I have been supporting in this research, since I understand that some physical and psychic illnesses have marked and constituted the ways of being a teacher in the contemporary world. In the fourth axis of this research I analyze some of the teachers' reactions to the virtual pages. They are complaints and laments of their teaching that are publicly confessed, blurring the boundaries between the public and the private, approaching the discussions of Sibilia (2008) on the concept of eximality. And in the last section I show how some posts and narratives of teachers are associated with a counterconduct movement, discussed by Foucault. They are discourses strongly marked by a tone of irony, or that manifest in a way contrary to what is set in certain memes, created by the pages. Thus, in each category analyzed, I realized that the teacher malaise discourse produced in Facebook is linked to many other discourses, such as the mission, the medicalization, the hyperconfession and the contestation, and that all these discourses have been operating strategies of governance and acting in the processes of teacher subjectification.
 

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  • IE - Mestrado em Educação (Dissertações)