Abstract:
A partir de uma literariedade às avessas, o sonetista brasileiro Glauco Mattoso tece escritos que reverberam um trajeto e um projeto tanto literários quanto identitários e que desembocam na instituição de uma poética unicamente sua. Tendo como base um recorte de sonetos proveniente dos livros Pegadas noturnas (2004), Saccola de feira (2014) e Poesia vaginal (2015), desenvolvemos, na presente dissertação, uma análise panorâmica de sua lírica, dentro da história da literatura, buscando compreender não só de que modo se constroem ambos, texto e identidade glaucomattosianos, mas também de que forma Mattoso distorce, em seus poemas, os jogos sociossexuais de poder que nos circundam através de retratos da prática do sadomasoquismo. Com isso, ao fim, entenderemos de que maneira se estrutura a poética glaucomattosiana, responsável por unir os gêneros escriturais erótico e pornográfico em uma só ode à violência, à sujeira e a uma sexualidade liberta e sublimática ao seu modo. Para tanto, recorremos, em nosso estudo, a discussões teóricas que versam sobre as bases dessa sociedade que vigia, doutrina e generifica os seres e suas falas, algo que encontramos nos textos de Michel
Foucault (2014), Judith Butler (2018) e Pierre Bourdieu (2017). Ademais, compondo nosso aporte teórico sobre erotismo e pornografia, temos as propostas conceituais de Georges Bataille (2017), Sandra M. Lapeiz e Eliane R. Moraes (1984), Lucia Castello Branco (1983) e Dominique Maingueneau (2010). Dessa amálgama teórica e literária, emerge, portanto, a conclusão de que a poética glaucomattosiana serve de reflexo combativo tanto para essa sociedade que constantemente repreendeu os movimentos de seu criador, seja por sua sexualidade, seus gostos ou por sua cegueira, quanto para uma história da literatura que, com seu olhar seletivo, continuamente fez de Mattoso um simples vulto, tentando, em vão, encaixar em moldes literariamente aceitáveis uma obra que, em suma, sempre será revoltosa e incongruente.
Product of a topsy-turvy type of literature, Brazilian sonneteer Glauco Mattoso weaves poems that reflect a life path and project that are both literary and identity-driven and that result on a poetics that is uniquely his. Therefore, on this dissertation, taking into account a selection of poems that has its basis on three books by Mattoso – Pegadas noturnas (2004), Saccola de feira (2014) and Poesia vaginal (2015) –, we proposed a panoramic view of his literary work and ventured into answering not only how the glaucomattosian identity and text are structured, but also how Mattoso distorts and reinterprets the sociosexual power relations that surround us through the depiction of sadomasochistic scenarios. With that done, we will then seek answers for how the glaucomattosian poetics can be explained, taking into consideration that it is the result of the merge between the erotic and pornographic literary genres and that it serves as an ode to violence, filth and an unshackled type of sexuality. In order to achieve these objectives, we constructed as our theoretical basis a selection of theories that reflect on the complex machinery behind this society that watches, doctrines and genderifies the beings and their speeches, discussions which can be found on texts by Michel Foucault (2014), Judith Butler (2018) and Pierre Bourdieu (2017). Moreover, the theoretical considerations of Georges Bataille (2017), Sandra M. Lapeiz and Eliane R. Moraes (1984), Lucia Castello Branco (1983),
and Dominique Maingueneau (2010) serve as a key-element to our discussion on the
conceptualization of erotism and pornography. It is from the depths of this theoretic and literary amalgamation that then emerges the conclusion that the glaucomattosian poetics can be understood as a combative reflection of both a society that have reprimanded its creator, be it for his sexuality, his unusual taste or his blindness, and a literary history that, with its selective point of view, has continuously turned Mattoso into a forsaken ghost writer, constantly trying, although in vain, to fit into a mold a literary work that will never be categorized, staying always a mutinous and incongruent creation.
