Isolamento e identificação de células branquiais ricas em mitocôndrias de bivalves e sua utilização em ensaios toxicológicos

Nogueira, Lygia Sega

Abstract:

 
No presente estudo, células branquiais do mexilhão de água doce Lasmigona costata e do marisco de água salgada Mesodesma mactroides foram isoladas, fracionadas, caracterizadas e utilizadas em ensaios toxicológicos com cobre (Cu). As células brânquiais do mexilhão e do marisco foram isoladas utilizando-se dissociação enzimática e mecânica do tecido, respectivamente. Para ambas as espécies, gradiente de densidade (Percoll) foi utilizado para separar as células isoladas em duas Frações (I e II). A presença de células ricas em mitocôndrias foi caracterizada na Fração II através de marcadores mitocondriais e da medida da atividade da Na+,K+-ATPase. A possibilidade de aplicação deste modelo biológico em estudos toxicológicos in vitro foi avaliada através da exposição das células da Fração II a concentrações ambientalmente relevantes de Cu (5, 9 e 20 µg/L) em condição isosmótica (840 mOsmol/Kg H2O). Para ambas as espécies, o Cu não induziu toxicidade letal, mas causou acumulação celular do metal e diminuição do conteúdo de Na+. De fato, uma correlação negativa entre estes parâmetros foi observada, sugerindo a competição do Cu com o Na+ por sítios de ligação na membrana plasmática. Posteriormente, foi realizada a exposição de células ricas em mitocôndrias de M. mactroides seguida da análise da viabilidade celular, do conteúdo iônico (Na+, K+, Ca2+, Mg2+ e Cl-) e da atividade de enzimas envolvidas na regulação iônica (Na+,K+-ATPase e anidrase carbônica), nas condições descritas acima. Foi observada redução no conteúdo de Na+, K+ e Mg2+ e inibição da atividade da anidrase carbônica após exposição a 20 µg Cu/L, sem efeito na viabilidade celular, nos conteúdos Ca2+ e Cl- e na atividade da Na+,K+-ATPase. Visto que a salinidade da água influencia a toxicidade do Cu, células ricas em mitocôndria de M. mactroides foram mantidas em condição isosmótica ou transferidas para meios hiposmóticos (730 e 670 mOsmol/Kg H2O) na ausência e na presença de Cu. Neste caso, foram avaliadas a viabilidade celular, o conteúdo de Cu e de Na+, bem como as atividades da Na+,K+-ATPase e anidrase carbônica. Na ausência de Cu, o choque hiposmótico reduziu a viabilidade celular e o conteúdo de Cu, sem alterar o conteúdo de Na+ e a atividade das enzimas. Na presença de Cu, houve acúmulo de Cu, redução do conteúdo de Na+ e inibição da atividade da anidrase carbônica em células expostas a 20 µg Cu/L em meio isosmótico. Na exposição em meio hiposmótico, houve acúmulo de Cu e inibição da atividade da anidrase carbônica nas células expostas a 9 µg Cu/L e redução do conteúdo de Na+ e inibição das atividades da Na+,K+-ATPase e anidrase carbônica nas células expostas a 20 µg Cu/L. Estes resultados indicam a viabilidade das técnicas empregadas para isolamento e fracionamento de células ricas em mitocôndria de brânquias de L. costata e M. mactroides, bem como o uso destas células em testes toxicológicos visando a compreensão do mecanismo de toxicidade do Cu em ambientes dulcícolas e marinhos. Além disso, indicam que o Cu é um tóxico ionorregulatório em bivalves de água doce e marinha e que não somente a química da água, mas também a fisiologia do animal é importante para previsão da toxicidade do Cu. Neste contexto, os resultados do presente estudo apontam a atividade da anidrase carbônica de células branquiais ricas em mitocôndrias de bivalves como um potencial biomarcador da exposição ao Cu em ambientes aquáticos.
 
In the present study, gills cells from the freshwater mussel Lasmigona costata and the seawater clam Mesodesma mactroides were isolated, fractionated, characterized and employed in toxicological assays with copper (Cu). Mussel and clam gill cells were isolated employing enzymatic and mechanical dissociation, respectively. For both species, density gradient (Percoll) was employed to separate isolated cells into two Fractions (I e II). The presence of cells rich in mitochondria was characterized in the Fraction II through mitochondrial dyes and Na+,K+-ATPase activity measurement. The possible application of this biological model in in vitro toxicological studies was evaluated exposing cells of Fraction II to environmental relevant Cu concentrations (5, 9 and 20 µg/L) in isosmotic medium (840 mOsmol/Kg H2O). For both species, Cu exposure did not induce lethal toxicity, but caused cellular accumulation of Cu and reduction in Na+ content. A negative correlation between these parameters was observed, suggesting a competition between Cu a Na+ for binding sites on the plasma membrane. Following this experiment, cells rich in mitochondria isolated from gills of M. mactroides were exposed to Cu under the experimental conditions described above and cellular viability, ionic content (Na+, K+, Ca2+, Mg2+ and Cl-), and the activity of enzymes involved in ionic regulation (Na+,K+-ATPase and carbonic anhydrase) were analyzed. Reduced Na+, K+ and Mg2+ content and inhibition of carbonic anhydrase activity was observed in cells exposed to 20 µg Cu/L, without changes in cell viability, Ca2+ and Cl- contents, and Na+,K+-ATPase activity. Because water salinity can influence Cu toxicity, cells rich in mitochondria of M. mactroides were maintained in isosmotic medium or transferred to hypoosmotic media (730 e 670 mOsmol/Kg H2O) for 3 h, in the absence or the presence of Cu. In this case, cell viability, Cu and Na+ contents, and enzyme activity (Na+,K+-ATPase and carbonic anhydrase) were analyzed. In the absence of Cu, the hypoosmotic shock reduced cell viability and Cu content, without effects on Na+ content and enzymes activities. In the presence of Cu, there was Cu accumulation, reduction in Na+ content and inhibition of the carbonic anhydrase activity in cells exposed to 20 µg Cu/L in isosmotic medium. In the hypoosmotic media, there were Cu accumulation and inhibition of the carbonic anhydrase activity in cells exposed to 9 µg Cu/L and decrease in Na+ content and inhibition of the activity of both Na+,K+-ATPase and carbonic anhydrase in cells exposed to 20 µg Cu/L. These findings indicate the viability of techniques employed to isolate and fractionate cells rich in mitochondria from gills of L. costata and M. mactroides, as well as their use in toxicological assays aiming to understand the mechanism of Cu toxicity in freshwater and seawater environments. Also, they indicate that Cu is an ionoregulatory toxicant in freshwater and seawater bivalves and suggest that not only the water chemistry, but animals physiology is important in predicting Cu toxicity. In this context, results from the present study point out the carbonic anhydrase activity of gill cells rich in mitochondria from bivalves as a potential biomarker of Cu exposure in aquatic environments.
 

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