Assistência à saúde sexual e reprodutiva da mulher com transtorno mental

Abstract

O direito de desfrutar de uma vida sexual e reprodutiva segura e satisfatória, muitas vezes, é negado à mulher com transtorno mental. Apesar da conferência do Cairo ter emanado diretivas concernentes ao atendimento integral a saúde da mulher, esta recebe, nos serviços de saúde, um cuidado delimitado ao período da gravidez e fragmentado na medida em que a ênfase está nas questões voltadas à reprodução. Tal situação toma maiores proporções na mulher com transtorno mental, na medida em que, frequentemente, esta enfrenta situações de estigma e preconceito, não sendo vista como suficientemente capaz de autocuidar-se. A saúde sexual e reprodutiva da mulher com transtorno mental é um tema globalmente emergente, com discussão ainda incipiente na realidade do país de Cabo Verde. Este estudo teve como objetivo geral: compreender as influências que moldam a assistência à saúde sexual e reprodutiva da mulher com transtorno mental na rede de serviços de saúde da ilha de São Vicente/Cabo Verde/África. Especificamente, o presente estudo objetiva: (1) identificar a percepção dos profissionais de saúde acerca da saúde sexual e reprodutiva da mulher com transtorno mental; (2) identificar as referências de natureza cultural, acadêmicas e institucionais que os profissionais utilizam para moldar a assistência à saúde sexual e reprodutiva prestada às mulheres com transtorno mental. Trata-se de um estudo exploratório, descritivo, de natureza qualitativa, que utilizou como referencial teórico a teoria da Diversidade e Universalidade do Cuidado Cultural de Leininger, desenvolvido com 17 profissionais de saúde que prestam atendimento a essas mulheres nos cinco Centros de Saúde, no Centro Reprodutivo e no Serviço de Psiquiatria do hospital geral de São Vicente/Cabo Verde. Os dados foram coletados a partir de entrevistas semiestruturadas, por meio de videoconferência entre Brasil e Cabo Verde, nos meses de setembro e outubro de 2018 e, posteriormente, submetidas à técnica de análise temática. Foram respeitados todos os preceitos éticos e legais da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde que trata de pesquisas com seres humanos. Os resultados, apresentados no formato de dois artigos científicos, apontam que a percepção dos profissionais de saúde em relação à saúde sexual e reprodutiva da mulher com transtorno mental é influenciada pelo contexto socioeconômico e cultural do país, o que leva a uma invisibilidade das competências dessas mulheres para o cuidado da sua saúde e a saúde de seu(s) filho(s). Essa situação agrava-se ainda mais devido ao fato de alguns profissionais considerarem que o cuidado dessas mulheres é da responsabilidade unicamente da psiquiatria. Nesse contexto, fica comprometida a prestação de cidados integrais à saúde sexual e reprodutiva dessas mulheres nos serviços de cuidados primários, o que acaba comprometendo a autonomia e os direitos sexuais e reprodutivos dessa população específica. Concluiu-se que os estigmas em relação aos transtornos mentais contribuem para aumentar as dificuldades dos profissionais para tratar das questões inerentes a saúde sexual e reprodutiva das mulheres, particularmente, a dificuldade para reconhecerem as competências desse grupo para cuidar de sua própria saúde. Em consequência, a assistência dispensada não responde as necessidades dessas mulheres, sendo que o principal foco é delimitado a prevenção da gravidez.

The right to enjoy a safe and satisfying sexual and reproductive life is often denied to a woman with a mental disorder. Although the Cairo conference emanated directives concerning the integral care of women's health, it receives, in the health services, a care limited to the period of pregnancy and fragmented insofar as the emphasis is on issues of reproduction. This situation takes on greater proportions in the woman with mental disorder, since she often faces situations of stigma and prejudice, and is not seen as sufficiently capable of self-care. The sexual and reproductive health of women with mental disorders is a globally emerging issue, with a still incipient discussion in the reality of the country of Cape Verde. The purpose of this study was to understand the influences that shape the sexual and reproductive health care of women with mental disorders in the health services network of the island of São Vicente / Cape Verde / Africa. Specifically, the present study aims to: (1) identify the perception of health professionals about the sexual and reproductive health of women with mental disorders; (2) identify the cultural, academic and institutional references that practitioners use to shape sexual and reproductive health care provided to women with mental disorders. This is an exploratory, descriptive study of a qualitative nature, using Leininger's theory of Diversity and Universality of Cultural Care as a theoretical reference, developed with 17 health professionals who provide care to these women in the five Health Centers in the Reproductive Center and in the Psychiatric Service of the general hospital of São Vicente / Cape Verde. The data were collected from semi-structured interviews, through videoconference between Brazil and Cape Verde, in the months of September and October of 2018 and, later, submitted to the thematic analysis technique. All the ethical and legal precepts of Resolution 466/12 of the National Health Council dealing with research with human beings were respected. The results, presented in the form of two scientific articles, indicate that the perception of health professionals regarding the sexual and reproductive health of women with mental disorders is influenced by the socioeconomic and cultural context of the country, which leads to an invisibility of the competences of these women women to take care of their health and the health of their child (ren). This situation is further aggravated by the fact that some professionals consider that the care of these women is solely the responsibility of psychiatry. In this context, it is committed to provide full citizenship to the sexual and reproductive health of these women in primary care services, which endangers the autonomy and sexual and reproductive rights of this specific population. It was concluded that stigmas in relation to mental disorders contribute to increase the difficulties of professionals to deal with issues related to women's sexual and reproductive health, particularly the difficulty in recognizing the competencies of this group to take care of their own health. As a result, the care provided does not meet the needs of these women, and the main focus is on the prevention of pregnancy.