Identificação de unidades populacionais de Pontoporia Blainvillei (Cetacea: Pontoporiidae) através de morfologia externa.

Barbato, Beatriz Helena Almeida

Abstract:

 
A captura acidental em redes de emalhe constitui a maior ameaça à sobrevivência das toninhas, espécie de cetáceo de distribuição costeira restrita ao Atlântico Sul Ocidental. Como esta atividade ocorre em diferentes níveis ao longo da distribuição geográfica da espécie, é essencial a identificação de unidades populacionais discretas a fim de que sejam conduzidos procedimentos de conservação e manejo em âmbito local, preservando dessa forma o potencial evolutivo da espécie. Diversos estudos (e.g. craniometria, genética, populacionais e parasitológicos) indicaram a existência de diferentes populações de toninhas ao longo da sua distribuição. Quatro distintas áreas de manejo para toninhas (Franciscana Management Areas) foram propostas utilizando-se informações combinadas provenientes desses estudos: FMA I inclui as águas do Espírito Santo e Rio de Janeiro; FMA II cobre os estados de São Paulo a Santa Catarina; FMA III compreende as águas do Rio Grande do Sul e Uruguai e FMA IV abrange a região costeira norte da Argentina. As populações das FMAs I, II e III representam entidades demográficas distintas com limitado fluxo gênico, mas poucas evidências suportam a separação das populações do sul em FMA III e FMA IV. Estudos de morfologia externa podem fornecer contribuições importantes para a identificação de eventuais unidades populacionais. Este estudo teve como objetivo verificar a existência de variação na morfologia externa entre unidades populacionais pré-definidas para fins de manejo. Amostras provenientes de capturas acidentais na costa do Rio de Janeiro (FMA I), São Paulo (FMA II), Rio Grande do Sul (FMA III) e Argentina (FMA IV), foram disponibilizadas por distintos projetos de pesquisa. Quatorze caracteres métricos externos de um total de 78 indivíduos adultos foram utilizados. Machos e fêmeas foram analisados separadamente. A amostra designada como FMA IV não foi incluída na análise geral por conter apenas um macho adulto. A análise de componentes principais para grupos múltiplos (MGPCA) realizada entre as FMAs I, II e III mostrou que 70.94% da variação total dentro dos grupos pode ser explicada pelos três primeiros componentes, o primeiro deles sendo interpretado como um índice de tamanho geral e os demais, explicando variação na forma. A análise discriminante canônica (CVA) realizada para maximizar a discriminação entre os grupos revelou que as três primeiras variáveis canônicas evidenciaram 98.97% das diferenças entre os grupos. A combinação que melhor permitiu a separação entre as três áreas foi a representação conjunta de CV2 e CV3. Diferenças relacionadas à posição da nadadeira dorsal e ao comprimento do rostro parecem contribuir para separar, principalmente, as amostras FMA I e FMA III. Interpretações biológicas para as diferenças relacionadas à forma detectadas para a FMA II nao foram possíveis até o momento. A representação gráfica de CV1 e CV2 permitiu separar claramente os sexos evidenciando que a característica fundamental que os separa, é a posição relativa do umbigo, fendas genitais e ânus. Observou-se ainda um marcado dimorfismo sexual relacionado ao tamanho, sendo as fêmeas maiores que os machos em todas as áreas analisadas. As fêmeas da FMA IV, incluídas em análises subsequentes que utilizaram 12 medidas morfológicas externas, também mostraram diferenças em relação às fêmeas das demais áreas. Os três primeiros componentes principais explicam juntos 77.98% de toda a variação observada dentro dos grupos, relacionada à forma. As variáveis canônicas CV2 e CV3 mostram claramente a separação entre as quatro áreas, com os exemplares da FMA IV apresentando um comprimento corporal intermediário aos exemplares das FMA I e FMA III, e os da FMA II sendo menores que os exemplares das demais áreas. No que se refere à extensão das medidas anteriores do corpo, a representação gráfica das regiões de confiança dos escores individuais médios para CV2 mostrou maior semelhança entre FMA IV e FMA I. A diferenciação morfológica encontrada neste estudo concorda com outras abordagens, especialmente genética, e fornece suporte adicional para a designação proposta das quatro distintas áreas de manejo para toninhas. É provável que as diferenças morfológicas encontradas entre as distintas áreas ao longo da distribuição da espécie sejam condicionadas por pressões seletivas diferenciais para a ocupação de nicho, já que as características do habitat e hábitos alimentares variam entre as regiões. Entretanto, análises morfológicas utilizando um número maior de exemplares por amostra são recomendadas em estudos futuros com objetivo de reduzir o efeito da estocasticidade. Adicionalmente, a área de manejo designada como FMA I poderia ser considerada uma subespécie distinta, dado os indícios de uma distribuição descontínua, os resultados genéticos e morfológicos concordantes e o tempo de divergência genético relativamente curto entre esta e as populações do sul. Análises morfológicas e moleculares utilizando as mesmas amostras fazem-se necessárias para assegurar definições mais precisas acerca do status taxonômico dessas unidades.
 
Incidental mortality in fisheries, mainly gillnets is one of the most important causes of decline of several species of cetaceans around the world. High numbers of franciscanas (Pontoporia blainvillei) have been bycaught in gillnets for at least four decades. Both the level of the incidental catches and the species potential for response vary regionally along its distribution. Therefore, for conservation purposes, it is important to determine discrete management units (stocks) so impact can be assessed on a local basis. The identification of discrete units based on biological data contributes to preserve the evolutionary potential of species. Several studies have contributed to determine populational identity of franciscanas (e.g. osteological characters, molecular biology, populational and parasitological). Four Franciscana Management Areas (FMAs) were proposed, using the phylogeographic concept and a variety of proxies: FMA I includes coastal waters of Espírito Santo and Rio de Janeiro States; FMA II covers São Paulo to Santa Catarina States; FMA III comprises the coastal waters of Rio Grande do Sul and Uruguay and FMA IV represents the coastal waters of Northern Argentina. There is strong evidence that assert that the populations from FMAs I, II, III represent distinct demographic entities with limited gene flow. However, evidences for spliting FMA III from FMA IV are weak. Furthermore, the estimated levels of gene flow is high between neighbour populations (Rio Grande do Sul, Uruguay and Argentina) and tends to decrease as distance increases. External morphology could provide useful data for contributing to identification of discrete populational units. The aim of this study was to verify the existence of variation in external morphology among franciscanas from the four management areas predefined. The samples, coming from incidental catches off the coast of Rio de Janeiro (FMA I), São Paulo (FMA II), Rio Grande do Sul (FMA III) and Argentina (FMA IV), were made available by different research projects. Fourteen external metric characters of 78 adults specimens were used. Males and females were analysed separately. Only one adult male was present in the sample from FMA IV, which was excluded from the analysis. Principal component analysis between FMAs I, II and III showed that 70.94% of overall variation within groups can be explained by the first three components. The first component can be interpreted as an index of general size and the others explain shape variation. Canonical variate analysis showed similar results as those provided by plot of individual scores of principal components. The first three canonical variates showed 98.97% of differences between groups. The second and the third variates together showed the best discrimination between FMA I, II and III. Differences related to position of dorsal fin and anterior region of body seen to contribute for spliting, mainly, the samples FMA I and FMA III. It was not possible to do biological play related to shape for the differences from FMA II, but individuals from this area were smaller than individuals from all other areas. Specimens from FMA III showed dorsal fins further backwards. The anterior region of body seems to be longer in specimens from FMA I. Plot of CV1 and CV2 showed clear separation between sexes, showing that the fundamental character for separation is the relative position of umbilicus, genital slit and anus. Sexual dimorphism related to size was observed still, with females bigger than males for all areas analyzed. Females from FMA IV, included in subsequent analysis with 12 external morphological measurements, also showed clear differences. The first three principal components explain 77.98% of overall variation within groups, related to shape. Canonical variates CV2 and CV3 showed a separation between the four areas but with a little overlap. Specimens from FMA IV showed a total length intermediate between FMA I and FMA III and again, individuals from FMA II were smaller than individuals from all other areas. While females from FMA III seem to present larger appendices than females from other areas, females from FMA IV look similar to individuals from FMA I in the anterior portion of the body. Morphological differentiation found in this study agrees with some genetic approaches and gives additional support to the proposed FMAs. It is possible that morphological differences found among distinct areas along franciscanas distribution are due differential selection (ecological divergence) for niche occupation, since characteristics of habitat and franciscana ecology vary among locations. However, using a larger sample is recommended for reducing the stochasticity. Furthermore, franciscanas inhabiting FMA I could be considered a distinct subspecies, since the indication of a discontinuous distribution, a short time of genetic divergence between this and the southern units and the genetic and morphological results consistent. However, none taxonomic revision has been done yet. Using the same data set for morphological and molecular analyses is recommended for elucidating this issue.
 

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  • IO – Mestrado em Oceanografia Biológica - (Dissertações)