Abstract:
O aumento na ocorrência e severidade das zonas hipóxicas ou "zonas mortas" nas águas costeiras tem recebido uma grande atenção. Estas "zonas mortas" são conhecidas por não abrigarem qualquer tipo de vida aquática de interesse comercial (e.g. peixes e invertebrados). Entretanto, microorganismos podem sobreviver sob hipoxia. A Lagoa da Conceição em Florianópolis (SC) apresenta em sua região central condições de hipoxia/anoxia em função da estratificação da coluna de água. Estas condições se estabeleceram a partir de 1982, quando o canal de acesso a Lagoa foi dragado, permitindo a intrusão ao longo do ano de água salgada que se desloca ao fundo, causando a estratificação da coluna dágua. Este trabalho, organizado em 3 capítulos, teve como objetivos: 1. Avaliar a distribuição do bacterioplâncton e a sua relação com o oxigênio da água de fundo, 2. Avaliar a contribuição de bactérias anoxigênicas para a produção primária total do sistema e 3. Verificar a existência de uma cadeia alimentar microbiana que possa canalizar a matéria orgânica produzida nas regiões com baixos níveis de oxigênio. No primeiro capítulo foi caracterizada a distribuição espaçotemporal do bacterioplâncton, com a abundância de cianobactérias e bactérias filamentosas heterotróficas aumentando em direção ao sul, mas com o biovolume aumentando em direção oposta, i.e., de sul para norte. Esta distribuição foi relacionada à concentração de amônio e fosfato. Entretanto, tanto a abundância quanto o biovolume foram significativamente maiores no verão. Nas águas de fundo da região estratificada, foi observado que a predominância das bactérias heterotróficas esteve relacionada às águas hipóxicas no inverno e que as bactérias fotoautotróficas estiveram relacionadas às águas ricas em oxigênio no verão. Sugere-se que a luz e a estagnação da coluna dágua atuem como fatores reguladores do consumo ou produção de oxigênio nas águas de fundo de região estratificada. Os resultados do segundo capítulo mostraram que a produção de oxigênio (PPO) e a assimilação de dióxido de carbono (PPT) estiveram relacionadas positivamente no verão indicando uma maior produção primária oxigênica neste período. No outono, entretanto, foi verificado um "desacoplamento" entre PPT e PPO, com elevada incorporação de dióxido de carbono, mas sem produção de oxigênio. Neste período a razão entre Bchl a/Chl a alcançou 47% na água subóxica de fundo, o que indica uma maior contribuição de bactérias anoxigênicas para a produção primária total. A similaridade entre as assembléias bacterianas nas águas óxicas de superfície do setor Sul e as das águas subóxicas de fundo do setor Centro Sul sugerem que as bactérias anaeróbicas anoxigências fototróficas (AnAnP) podem estar contribuindo para a PPT em águas oxigenadas e subóxicas na Lagoa, sobrevivendo no interior de partículas suspensas nas águas de superfície (microhabitats). No terceiro capítulo foram quantificadas a densidade e a biomassa de bactérias e protozoários na água de fundo de uma estação estratificada com baixo teor de oxigênio dissolvido e comparadas a uma estação localizada em região homogênea e oxigenada. Cada grupo funcional bacteriano esteve correlacionado com uma classe de tamanho do protozooplânton, o que indica uma interação trófica entre esses grupos, com a transferência da matéria orgânica produzida pelas bactérias para o protozooplâncton. A biomassa de bacterioplâncton (0,32 µg C mL-1) e de protozooplâncton (flagelados, 0,26 µg C mL-1 e ciliados, 0,18 µg C mL-1) na água de fundo subóxica da estação 33 (estratificada) foi cerca de cinco vezes maior do que àquela medida na estação 82 (homogênea) que apresentou somente 0,065, 0,054 e 0,006 µg C mL-1 de biomassa de bactérias, flagelados e ciliados, respectivamente. Com isso, as "zonas mortas" observadas na Lagoa da Conceição consistem em regiões com produção de matéria orgânica significativa pelas bactérias anoxigênicas que representam a base da cadeia trófica nesta região. É provável que processos semelhantes aconteçam em outras regiões com baixos níveis de oxigênio em regiões costeiras ao redor do mundo. Se isto acontecer, o conceito de "zonas mortas" precisará ser revisto.
The increasing occurrence and severity of the hypoxic or “dead zones” in the coastalwaters has received great attention lately. These “dead zones” are known by notharboring any type of aquatic life of commercial interest (e.g fish and invertebrates).However, microorganisms can survive under hypoxia. The Conceição Lagoon inFlorianópolis (SC) presents hypoxia/anoxia conditions in its central region where thewater column is stratified. These conditions have established in the Lagoon since 1982,when the channel that connects the Lagoon to the Ocean was dredged, which allowedthe intrusion of seawater and caused the stratification of the water column. This work,organized in three chapters, had as objectives: 1. To evaluate the distribution ofbacterioplankton and its relation with the bottom water oxygen, 2. To evaluate thecontribution of anoxygenic bacteria to total primary production of the system and 3. Toverify the existence of a microbial food chain that may transfer the produced organicmatter in these low oxygen regions. In the first chapter, the spatial-temporal distributionof bacterioplâncton was characterized, with increasing abundance of cyanobacteria andheterotrophic filamentous bacteria towards the south, but with the biovolume increasingin opposite direction, i.e., from south to north. This distribution was related to theconcentration of ammonium and phosphate. However, either the abundance or thebiovolume were significantly higher during summer. In the bottom waters of thestratified region, the predominance of heterotrophic bacteria was related to hypoxicwaters in winter, while in summer photoautotrophic bacteria dominated in oxygen-richwaters. We suggested that light acts as the major regulating factor of the consumptionor production of oxygen in deep waters of the stratified region. The results of the second chapter showed that the oxygenic primary production production (OPP) and thecarbon dioxide assimilation (TPP) were positively related to each other in summerindicating a higher oxygenic primary production in this period. In autumn, however, an“uncoupled” relationship was observed between TPP and OPP, with higher carbondioxide fixation, but no oxygen production. In autumn, BChl a/Chl a ratio was up to47% in the suboxic waters, which indicates a higher contribution of anoxygenic bacteriato total primary production. The similarity among the bacterial assemblages of surfaceoxic waters from the southern sector and of bottom suboxic waters from the CS sectorsuggests that the AnAnP bacteria can be contributing with the TPP of suboxic and oxicwaters in the Lagoon, surviving inside the suspended particles in surface waters. In thethird chapter, the abundance and biomass of bacteria and protozoans were quantifiedfrom the low oxygen bottom waters of a stratified site and compared with a site locatedin a homogeneous and oxygenated region. Each functional group of bacteria wascorrelated with a size class of protozooplankton, indicating a trophic interactionbetween them, with a transfer of the organic material produced by different bacterialpopulations through protozooplankton predation. The biomass of bacterioplankton (0.32µg C mL-1) and of protozooplankton (flagellates, 0.26 µg C mL-1 and ciliates, 0.18 µg CmL-1) in the suboxic bottom waters of site #33 (stratified) was five-fold higher than thatmeasured in site #82 (homogeneous) that only presented biomass of 0.065, 0.054 and0.006 µg C mL-1 produced by bacteria, flagellates and ciliate, respectively. Therefore, itwas shown that the “dead zones” observed in the Conceição Lagoon consist of regionswith significant organic matter production by anoxygenic bacteria that represent thebasis of the trophic food in this region. It is likely that similar processes may occur in other coastal regions with low oxygen levels throughout the world. If this is the case,the concept of “dead zones” should be reevaluated.