Abstract:
A presente dissertação consiste na análise do romance Longe de Manaus, de
Francisco José Viegas, publicado em 2005, em Portugal. O trabalho tem como
objetivo responder ao questionamento de quais são as funções dos
testemunhos na refiguração do tempo e na narração do passado? No âmbito
teórico, analisa os atos de testemunhar e narrar associados ao conceito de
memória e à ideia de distância a partir das abordagens de Paul Ricoeur e das
contribuições de Carlo Guinzburg, de modo a relacionar a tradição do olhar
interior com o exterior. Nos dois casos, a leitura de Agostinho se faz presente,
pois o filósofo inaugura a memória como um produto da linguagem e preconiza
a busca dos vestígios nos fenômenos mnemônicos. O contexto de produção é
introduzido com as proposições de Eduardo Lourenço sobre a identidade
nacional portuguesa, com a definição de sul proposta por Boaventura de Souza
Santos e pelas colocações de Edgar Morin acerca do marxismo na atualidade,
além de retomar a conjuntura da década de 1970 tendo em vista as pesquisas
dos historiadores Eric Hobsbawn e Majhemout Diop, que estudaram o
neocolonialismo. No âmbito analítico, é interpretada a organização cíclica do
romance que entrecruza personagens e vozes narrativas de espaços e
temporalidades diferentes, com a finalidade de abordar como a pobreza e a
violência podem ser fatores constantes na África da década de 1970, sob o
domínio imperial lusitano, ou nas cidades do Porto, São Paulo e Manaus
contemporâneas. O narrador apresenta problemas sociais em Portugal, nos
anos 2000, atrelados às politicas econômicas e à entrada de imigrantes do sul;
concomitantemente, o protagonista Jaime Ramos debate a sua sociedade a
partir de dois critérios: o de identidade nacional portuguesa, segundo o critério
levantado por ele de solidão, e o de defesa da luta de classes como fator
primordial para compreender os assassinatos investigados pela personagem. O
estudo articula as noções de memória e literatura com a finalidade de analisar
as estratégias narrativas presentes em Longe de Manaus.
This thesis consists of the analysis of the novel Longe de Manaus by Francisco
José Viegas, published in Portugal in 2005. The study aims to answer the
question raised about the roles of the testimonies in the refiguration of time and
in the historical narrative. At the theoretical level, the interest lies on how the
acts of witnessing and narrating associated with the concept of memory and the
idea of distance from the approaches of Paul Ricoeur and the contributions of
Carlos Ginzburg, in order to relate the tradition of the internal view to the
external view. In both cases, the reading of Augustine is present, for the
philosopher inaugurates memory as a product of language and encourages the
search for vestiges in the mnemonic phenomena. The context of production is
introduced with the propositions of Eduardo Lourenço on the Portuguese
national identity, with the definition of south proposed by Boaventura de Souza
Santos and the considerations of Edgar Morin about Marxism today. It also
recaptures the conjuncture of the 1970s by considering the research of the
historians Eric Hobsbawm and Majhemout Diop who studied neocolonialism. In
the analytical framework the cyclical organization of the novel that intertwines
characters and narrative voices of different spaces and temporalities is
interpreted in order to address how poverty and violence can be constant
factors in Africa in the 1970s under the Lusitanian imperial rule or in the
contemporary cities of Porto, Sao Paulo and Manaus. The narrator presents
social problems in Portugal in the 2000s linked to economic policies and the
arrival of immigrants from the south. Concomitantly, the protagonist Jaime
Ramos debates his society based on two criteria: the Portuguese national
identity, according to the criterion raised by him, of loneliness and the defense
of class struggle as paramount factor to understand the murders investigated by
the character. The study articulates the notions of memory and literature with
the purpose of analyzing the narrative strategies in Longe de Manaus.